terça-feira, 27 de dezembro de 2011

Parecendo ser






















Migalhas ao Sol










Ao varal dos pardais
Volto a ciscar
Migalhas ao Sol
Arquejo e fraquejo
E o tempo voa na vez
Que se possa estar contente
Ser o que fora presente
Onde passa a graça da flor
É este meu desejo de retornar
Mancha que ilude talvez
Ao quaradouro alvejaria
A graça do meu ser contente
Ser o que fora ao sol da vez.


Velha mesmo era minha avó
Olhei para trás
O lugar – Distante - Morrido
Lá está a mesinha do quintal
Ausente de afazeres
Já me sinto velha - Eu era menina
Velha mesmo era minha avó
Falava-me de coisa lógica
Uma vez seríamos peixe
Ou seríamos árvore?
Fingia não entender
Um dia iria morrer
Morreremos todos - Um dia
Enganados? Talvez a babar
Em prazeres lógicos
Altruísmo
De irracional natureza
Retórica nunca entendida.


Estranha forma de sobrevivência
Eis aqui o ser morrido
Ao contentamento faminto
Estranha sobrevivência
Entranhas apodrecidas
Reconhecimento
De que ao pó voltarás
Despojado do grito fatal
Sua branca carne dura ao gelo
Ao frigorífico do atacadista
Duração do perecível
São estes os mortos
Que alimentam os vivos
Que regurgitarão
De suas entranhas apodrecidas
Estranha forma de sobrevivência.


Ao chão dos despojados
Corre-te o ventre
Eficiente
Penetra tuas entranhas
Ausente de afetos
Somente o cruel afago ao rasgo
Segue a lâmina ao corte
Vazados estão os teus olhos
Não fitas lugar algum
Somente as horas perdidas
Lamento do não retornar
E as luzes de teus olhos
Ao chão dos despojados
Diluída cor de mar
Aos gatos famintos deste quintal
Olho de peixe badejo.

Se põe ao canto
Seus metais pesados
Meu lábio amargo
Seus resquícios
Na minha unha roxa
Um pedaço da meia-noite
Inacabada porcelana
Sol de lâmpada ao canto
Meia xícara do que mais for
São esses biscoitos vermelhos
Senão outra coisa
Ao negro cão que se põe ao canto
O que deixou de se falar
Uma suave forma de intoxicação.


Por onde ser


Migalhas ao Sol
Ao varal dos pardais
Volto a ciscar
Migalhas ao Sol
Arquejo e fraquejo
E o tempo voa na vez
Que se possa estar contente
Ser o que fora presente
Onde passa a graça da flor
É este meu desejo de retornar
Mancha que ilude talvez
Ao quaradouro alvejaria
A graça do ser contente
Ser o que fora ao sol da vez.














Velha mesmo era minha avó
Olhei para trás
O lugar – Distante
Morrido
Lá está
A mesinha do quintal
Ausente de afazeres
Já me sinto velha - Eu era menina
Velha mesmo era minha avó
Falava-me de coisa lógica
Uma vez seríamos peixe
Ou seríamos árvore?
Fingia não entender
Um dia iria morrer
Morreremos todos - Um dia
Enganados?
Talvez a babar
Em prazeres lógicos
Altruísmo
De irracional natureza
Retórica nunca entendida.








Estranha sobrevivência

Eis aqui o ser morrido
Ao contentamento faminto
Estranha sobrevivência
Entranhas apodrecidas
Reconhecimento
De que ao pó voltarás
Despojado do grito fatal
Sua branca carne dura ao gelo
Ao frigorífico do atacadista
Duração do perecível
São estes os mortos
Que alimentam os vivos
Que regurgitarão
De suas entranhas apodrecidas
Estranha forma de sobrevivência.









Ao chão dos despojados
Corre-te o ventre
Eficiente
Penetra tuas entranhas
Ausente de afetos
Somente o cruel afago ao rasgo
Segue a lâmina ao corte
Vazados estão os teus olhos
Não fitas lugar algum
Somente as horas perdidas
Lamento do não retornar
E as luzes de teus olhos
Ao chão dos despojados
Diluída cor de mar
Aos gatos famintos deste quintal
Olho de peixe badejo.

Se põe ao canto
Seus metais pesados
Meu lábio amargo
Seus resquícios
Na minha unha roxa
Um pedaço da meia-noite
Inacabada porcelana
Sol de lâmpada ao canto
Meia xícara do que mais for
São esses biscoitos vermelhos
Senão outra coisa
Ao negro cão que se põe ao canto
O que deixou de se falar
Uma suave forma de intoxicação.

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

Feriado de fato




Eis-me aqui outra vez




Nesta manhã de porta fechadas




Cheia de algo mais




São estas calçadas vazias




Ausente de pisares




Escuto melodias




Suas sacadas de ferro fundido




Música de suas bigornas




Escondida nos meus versos




O fado de ontem




O fado de hoje?




Não faz mal




Alegra-me de fato o feriado




De voltar a pisar




Estas pedras cantadas




Deste solo português.








(Amália Grimaldi, Lisboa julho 2011)

terça-feira, 16 de agosto de 2011

Mortas e Belas



É manhã à varanda



Cai a folha gigante



São muitas delas



Devagar plainam no ar



Antes de tocarem ao chão



Seus sopros de vida



As folhas são rubras



Amareladas outras



Pois assim se apresentam



Já mortas e belas. Como



As meninas de Velasquez



Nas sombras de Caravaggio.



(Amália Grimaldi)










segunda-feira, 25 de julho de 2011

Ainda me restam trinta minutos




Vê, estou aqui. Gritemos aos pardais de quintais alheios

Entreolhemo-nos em nossos fingimentos

Curtos sorrisos de lado


Vê, o monumento ainda se ergue sã

Só o mundo está prestes a cair

Pedras estão a rolar insanas

Somente a palmeira ainda se ergue sã


Vê, é a agonia de quem pensa maior

No que fazer de suas entranhas

Medonha sinuosa linha de brancos vermes

- Rejeito a sua pena


Vê, são folhas de jornal

Levadas ao vento destas ruas de domingo

É a leveza de despojados

Ao rancor de seus dias descuidados


Vê, ainda restam-me trinta minutos

Para adoçar este café. Maldoso cálice

Resta-me ainda o curto sorriso

Desdobro ao seu respaldo

- Colher rasa de escárnio.

(Amália Grimaldi)

domingo, 24 de julho de 2011

Geleiras: Estudo sobre os Rondós de Silva Alvarenga

Geleiras: Estudo sobre os Rondós de Silva Alvarenga: "Espero que isso ajude um pouco... Vendo agora, eu falei mais sobre o rondó de Silva Alvarenga, vou estudar mais as “outras formas dessa for..."

quinta-feira, 14 de julho de 2011

Não seria como antes


Não seria como antes

A desculpa
O buraco na parede
Seu gesto de mão
O bom dia
Um pedido de socorro
Esqueci-me do café à mesa
E trocamos mútuas fatias
De pão e melancia
O vizinho cismado
Não seria como antes.

Choro em blues

Iguais e monótonos
São os quadros azuis
Ao longo desse corredor
Pó de cantos nunca espanados
Passo eu e minha bagagem
Em direção ao sujo das ruas
O homem à esquina já chora
Seus acordes em blues
Incomoda-me
O não ser essencial azul.

Ao Sol quintal dos vivos?


Do novo livro de poemas – Penas de Pardal – Amália Grimaldi

À porta de saída

Eu sou. Tu és
Perecível ele é
O que amadurecemos
Ao Sol quintal dos vivos?
Contagem regressiva
Duração do que nos resta
Iludir-se com o final do mundo
O síndico do prédio
Ao lado foi assassinado
Na última terça-feira
Esbarrado de seus motivos
À porta de saída
O alívio do próximo.

Ameaça real
Decidi fazer o mesmo
Os dias da monarquia
Estão contados. Atenção
Ameaça real em Tel-Aviv
Vegetais dormem
Sob tendas de nylon
Ao deserto estéril da paz
Cobrem cabeças o véu
Permissivo Califa
Dançarei em Andaluzia
A complacência do mundo
À terra do outro
Paraíso de vida nômade
Onde becos tem saída
E as distâncias são curtas
Em desvios de atenção
Ameaça real.

domingo, 10 de julho de 2011

Stella Florence: Uma carta de desamor

Stella Florence: Uma carta de desamor: "(Obs.: Este texto faz parte do livro 'Os Indecentes - crônicas sobre amor e sexo') Há algum tempo, condoída pelo fora que uma amiga levara..."

sábado, 2 de julho de 2011

Transpor a Arrábida


Pés na terra
Descer à Península de Tróia
A alma do planeta
O corpo fala
Repicam os sinos
Os muares e seus fardos
Rota para o sul
Transpor a Arrábida
E suas pedras roladas
São tantas delas
Mas nas minhas mãos
Só cabem quatro delas.

Amália Grimaldi

Tarde lisboeta

Morrem as sombras da tarde
Lânguia luz aceno ao descanso
A parede sinto-a ainda morna
Suas cores de pêssego maduro
Ao voo raso faz seu reconhecimento
A ave. Outras mais estarão
À procura de pouso seguro
Ao acalanto da noite descente
Escombros do que era belo
Ainda conservam-se dignos
A casa das aves desgarradas
Em meio a avenida barulhenta
Onde torres de antigamente
Abrigavam seus fidalgos soberbos
Ao regresso de além-mar
Morrem as sombras dessa tarde
À luz do que era antes
Tardes atrazadas à espera
De acenos por acalentar-se
À luz do que era antes.

Amália Grimaldi

quinta-feira, 28 de abril de 2011

Despertar tardio




Todos sonham. Crueldades
Eu durmo no sonho
De múltiplas palavras ouvidas
Aguadas plenas. Cheias
Sapos verdes
Cochicham entre si
Parábolas de intrigas
Eu durmo no sonho.Crueldades
O despertar tardio
Demente pensar desmaiado
Acho que perdi a fotografia
do último verão dourado.

terça-feira, 29 de março de 2011

Cheiro de sutileza

Um desejo no ar
abro portas de satisfação
estou onde não estive
cheiro de lugar feliz
esfuziante
liberta-me do escrutínio moral
adentro quintal alheio
Oh cheiro de manga!

Amália Grimaldi

sexta-feira, 25 de março de 2011

A certeza do fim


A certeza do fim
Lá fora o Sol maior
Toca-lhe o caminho de casa
Seu horizonte
Era a linha do ombro
Do outro à frente
Posso ossos vossos?
O passo arriscado
Acabado. Sorri-lhe
A certeza do fim
Sob o peso dos passos
de quem ainda o segue
à sombra do Sol maior
Cava a sua própria cova
Em ossos de magras dúvidas
A certeza do fim
Lhe sorri.

A Ilusão do Ser

A ilusão do ser
Investimos na nossa aparência. Na nossa maneira de falar. Na imagem que gostaríamos de passar. Passamos ao largo da realidade. Somos todos uns pessimistas sorridentes. Esta é que é a verdade. Diante da concepção trágica do mundo não é que todos nós sorrimos?! Em segundas intenções, é claro. É o comportamento chamado social. O céu e o inferno da nossa existência - Rir e chorar. Precisamos da mentira para triunfar sobre a crueldade do mundo. Assim citou o filósofo Nietzsch. Concordo com ele.
O sorriso da mentira. Falso. Por isso, a verdade na crueldade do mundo é encoberta sob o véu da beleza. Uma necessidade de consolo para todos nós humanos. Falo isto olhando para os olhos gentis do meu cachorro, não tão gentil assim, ao morder as mãos do dono. Parece um cordeiro, mas não é. Na verdade, é um lobo em forma de cordeiro. Como as aparências enganam, ein?!
Na arte do sentimento tranqüilizador, na frágil trama da ilusão diante dos fios da mentira frente a um tear de um mundo impiedoso, está a falsidade.
Não. Não estou em depressão. É tarde de domingo...Apenas analisando a realidade, nua e crua. A mentira da boa aparência é a tragédia do homem ao criar um mundo de ilusões onde o abismo é o próprio chão onde se pisa. No cultivo da beleza ameniza-se a crueldade, sem contudo eliminá-la. Atenua-se o medo inerente e constante.Mas, o terror e o absurdo estarão sempre presentes. E agente então se benze. Transpõe a soleira da porta da morada rumo ao mundo lá fora. Na estética do medo está o temor da crueldade e por isso sorrimos. Eticamente falando. Admitir a realidade seria ser pessimista. Então, o ser sorri. Maravilha-se ante o inexplicável incompreendido ao mesmo tempo em que busca uma compreensão a esse incompreendido. É o despertar do ser tirando o homem do repouso da acomodação - nem admira nem se maravilha diante do que vê. É o despertar o ser. Escrevemos o que pensamos. Diremos a poesia do momento. No significado elementar da linguagem humana para a compreensão do indivíduo, ao fazer as nossas experiências explicáveis aos outros, se não a nós mesmos, dá-se a ilusão. É o caso de se vestir a pobreza do pacote em vistoso papel de seda.Na realidade, o homem não tem acesso às coisas do mundo tais quais elas realmente são.Dificuldade que é superada pela linguagem.Embora nomes, sejam encodificações de situações e coisas que nos cercam. Por isso me refugio na poesia. E não são as coisas que determinam a consciência do ser e sim a nossa postura diante dela. A atitude do vendedor perante o comprador iludido sob o pacote do engano.
A linguagem é importante mas não é o espelhamento do mundo real, mas antes, a vocalização em forma de metáforas. Quando esta é esquecida levamos à ilusão da verdade, à essência das coisas. Tanto no sorriso como na modulação das palavras, teremos a ilusão de que no abismo lá embaixo não cairemos, principalmente se outros prestarem atenção ao nosso comportamento, que seria nivelado como normal. É a tal política da boa vizinhança. Aceitar a situação incômoda. Uns se parecendo com os outros. É a estética da moral. É que vivemos o céu e o inferno da nossa existência. Por isso, a crueldade do mundo é a verdade. E a falsidade do sorriso do ser, uma mentira. Amália Grimaldi

A última página

A última página

A penumbra, cultivada. Eram as janelas veladas pelos ocres cetins da conveniência. Eis que fechara a porta ao insurgente. Também já não esperava que alguém aí batesse. Assim também deixaria lá fora o sol. Somente ao alcance de nuvens distantes. E, ao rugir do tempo presente também deixaria do lado de fora o vento passante.
Jardins bem cuidados, contornos suaves, sombras e luzes ajustadas. Colorido adequado,
de alegoria feliz. Nuvens brancas, inalcançáveis. Presenteava-lhe a grata figuração de um calendário de parede - cenário de última página.
Abriu a janela num ímpeto, sentira vontade de voar, ir de encontro à grata ilusão do inalcançável. Afinal de contas, o que somos nós humanos, senão um perseguidor de imagens ilusórias de felicidade que pintamos no nosso imaginário dia a dia?
Desprovido de asas, cuidou dos maiores detalhes. Cuidou também dos menores detalhes. Roupa nova. Mala nova. E, alimentando o seu engano de percepção, sobre uma pretensa integridade física, a mascarar o fardo do medo latente permanente, fez seguro de vida. Assim acreditava estar seguro na viagem.
Dobrados e acomodado, seguiriam com ele, medos e ansiedades. E, para conter o amarelado dos anos, a escova de dente, esta gasta companheira também não seria esquecida. Prezava o que restava-lhe, a subsistir-lhe a idéia de corpo físico são, o que entretanto com o passar da idade via deteriorar-se inexoravelmente.
Cores desconhecidas acenavam-lhe ao fim da rua caminhada - Prédios futuristas e jardins hidropônicos. Desconhecido era o contorno daquela cidade. Parecia-lhe áspero sob o sol daquela manhã despertada. Seguia a vagar por ruas enormes, avenidas extensas. Como sentia falta de brancos sorrisos! Aliás, perdera o seu já fazia muito tempo, afogado que fora, em copos d’água noturnais. Passou a sentir-se desbotadamente perdido naquelas cores de ilusão alheia. Assim, rumou ao encontro da página inicial.
Mais um ano se passara - perdera mais um dente, um a menos a poupar-lhe vida útil à escova já gasta. “Que mundo é esse...?” Melhor que fique lá fora. E, no conforto macio da sua resignação, vislumbra os contornos conhecidos da cidade do ano que passara. Olhos cerrados, no interior da sua irreversível paz construída, a vestir-lhe somente a penumbra da esperança ausente - perde-se o suspiro volátil.
- O prego, na parede se via nu. O calendário, sem cores, ao chão jazia frio.
- Inútil de precisares...

Amália Grimaldi

terça-feira, 1 de março de 2011

Voltei à casa...

Hoje,
voltei à casa da rua do cais do porto.
A porta estava aberta
passantes curiosos espiavam
nem me importei
um cheiro do mofo abstrato
lambeu o meu rosto
ventos atávicos
o longo corredor...
passadiço coerente
de tramas e dramas familiares
ecos de um tempo
aí ressoam insistentes
Hoje
a casa está à venda
a vista é do rio e dos saveiros
no quintal
a mangueira foi cortada
implicância de vizinho
cala-se a voz centenária
a casa desocupada
a árvore tombada
são apenas resquícios agonizantes
breve espaço necessário
intermediando inexorável
acontecimento posterior
fecho a porta devolvida
que por momentos se abriu
ao tempo que já passou
respirarei os ares frescos
da manhã que por certo virá
rumo ao cais do porto seguirei
contente e segura
confiante embarcarei
naquele saveiro amarelo
confiante ao rumo do cais do futuro.
Amália Grimaldi